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06 DE MARÇO DE 2019

'Igreja ensina que forma mais sublime de viver caridade é a política'


Diocese de Piracicaba apresenta nesta quinta-feira, durante reunião ordinária da Câmara, a Campanha da Fraternidade 2019, cujo tema discute políticas públicas.



EM PIRACICABA (SP)  

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Padre Kleber durante entrevista na Cúria Diocesana

Padre Kleber durante entrevista na Cúria Diocesana
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Padre Kleber durante entrevista na Cúria Diocesana

Padre Kleber durante entrevista na Cúria Diocesana
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Padre Kleber durante entrevista na Cúria Diocesana






"A Igreja Católica ensina que a forma mais sublime de se viver a caridade é a política. Não é a única, mas é a mais sublime." A frase, do padre Kleber Fernandes Danelon, revela o ponto de partida que deve servir de motivação a paróquias, clero e fiéis na Campanha da Fraternidade 2019. Lançada nacionalmente pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) nesta quarta-feira (6), a ação promovida durante a Quaresma vai, neste ano, discutir políticas públicas e meios de os cristãos terem papel mais ativo na formulação delas.

Em Piracicaba, a Diocese fará a apresentação do tema "Fraternidade e Políticas Públicas" durante a reunião ordinária desta quinta-feira (7) na Câmara de Vereadores, a partir das 19h30. A convite do presidente da Casa, Gilmar Rotta (MDB), o coordenador diocesano de pastoral, padre Kleber Fernandes Danelon, 40, abordará os principais pontos do texto-base que norteia a campanha e listará as propostas da CNBB a fim de ampliar a participação dos fiéis na política para além do voto a cada dois anos.

Em entrevista, o religioso classificou de "muito louvável" a iniciativa da Câmara de abrir espaço para a Campanha da Fraternidade ser discutida em plenário, entre os vereadores e com a possibilidade de interação com a comunidade. "A Constituição de 1988 garante a participação do povo em diversas instâncias, porém notamos que em alguns lugares isso é descuidado e, em outros, o governo até quer promovê-la, mas encontra um número pequeno de pessoas interessadas em participar das políticas públicas", observa o sacerdote.

"O objetivo da Campanha da Fraternidade é incentivar as pessoas a tomar consciência do que são políticas públicas, a engajar-se nos diversos conselhos, a participar das audiências, a acompanhar o Executivo e o Legislativo nos trabalhos realizados. No fundo, queremos tirar aquela imagem de que tudo que é político é ruim ou é 'sujo', porque a política tem um sentido muito belo que é a administração do bem comum. Gostaríamos de formar cristãos conscientes dessa responsabilidade", acrescenta padre Kleber.

Para Gilmar Rotta, o tema da Campanha da Fraternidade em 2019 "foi uma escolha certeira, principalmente num país que hoje está tendo mudanças praticamente em todo o setor político". "E a Câmara de Vereadores de Piracicaba não poderia ficar de fora, nem deixar de dar apoio à Diocese nessa campanha. Ao tratar de políticas públicas, é muito importante trazer esse debate para dentro da Casa, pois é onde elas são discutidas e onde ocorrem a troca de ideias, o fomento político."

O presidente cita o Portal da Transparência e o projeto Parlamento Aberto como ferramentas que levam a população para dentro do dia a dia da Câmara. "É objetivo da Mesa Diretora a total transparência do Poder Legislativo. Queremos que a população venha, participe, divulgue o trabalho, traga novas ideias, faça críticas positivas para que possamos ter um caminho correto a seguir. O Portal da Transparência e o Parlamento Aberto, que vamos oficializar em projeto de resolução, sendo a primeira cidade do país, são muito importantes e vão engrandecer ainda mais o debate político na cidade."

"TEMOS MUITA FORÇA" - A escolha de "Fraternidade e Políticas Públicas" para a edição de 2019, segundo padre Kleber, tem a ver com a avaliação da Igreja de que "a questão política precisava ser melhor refletida com a sociedade", embora a campanha, em anos anteriores, já tenha abordado temáticas próximas, como foram os casos da segurança pública, focada em 2009, e do saneamento básico, discutido em 2016.

Ele ressalta que o texto-base da Campanha da Fraternidade não elege um único aspecto relacionado ao momento político do país. "Mas educação, cultura e saúde, especialmente esses 20 anos de congelamento das verbas, preocupam a Igreja", diz. "Políticas públicas não podem ser reduzidas a políticas governamentais; elas nascem de uma necessidade, de uma realidade que precisa encontrar respostas que venham para ficar, para ser uma política não de governo, de um mandato ou de outro, mas que favoreça o bem comum."

O lema, "Serás libertado pelo direito e pela justiça", foi extraído do livro de Isaías. "Os profetas sempre trabalharam muito pelo fim da idolatria e pela construção de uma sociedade livre de toda a opressão estrangeira, que sabe reconhecer a ação de seu Deus e lutar por sua liberdade. Toda vez que abraça essa idolatria, o culto aos deuses estrangeiros, perde-se a identidade de seu próprio povo e da sua crença. A escolha do lema partiu desse contexto da palavra de Deus para iluminar a reflexão deste ano", explica padre Kleber.

O religioso chama a atenção para os desafios da Igreja diante do tema "Fraternidade e Políticas Públicas". Para ele, o estímulo à maior participação dos fiéis nas decisões políticas e, portanto, nas ações que levam ao bem comum passa por romper com a tendência ao individualismo observada na sociedade, fenômeno que o padre classifica como "cultura do selfie".

"Sozinhos não temos força nenhuma, mas, quando nos organizamos como comunidade, então temos muita força. Força para levar à prática a vontade de Deus para a vida em sociedade, rompendo com algumas ideias que trazemos como herança, como a de que só se vive a fé num nível espiritual. Não! A fé precisa descer aos alicerces da vida, às realidades concretas."

"Outro desafio para nós, padres, trabalharmos com o povo é como romper com essa corrente de individualismo, em que cada um quer cuidar do seu e, marcados pela atribuição de tantas tarefas do dia a dia, temos pouco tempo para o outro e para a sociedade. É preciso romper com essa 'cultura do selfie', ou seja, do viver para si e do cuidar de si, abrindo o olhar e dispondo de tempo para construir o bem comum. O cristão encontra o seu lugar participando, irmanando-se, cada um conforme sua capacidade", enfatiza o sacerdote.

Coordenador diocesano de pastoral desde 2016, padre Kleber observa que a Campanha da Fraternidade ––que coincide com os 40 dias da Quaresma, período que antecede a Páscoa e é, para os católicos, momento para oração, penitência e caridade–– deve prestar-se à conscientização, projetando "frutos que vamos ver com o passar do tempo".

"Por exemplo, as pastorais do surdo, da criança, da saúde, da terra, da ecologia; acredito que umas 20 nasceram da Campanha da Fraternidade", estima o religioso, para quem a experiência acumulada nessas iniciativas deve servir de impulso para os leigos "assumirem um protagonismo maior" nas esferas de participação política.

RELIGIÃO E POLÍTICA - Foi a partir de 1985 que o diálogo com temáticas sociais tornou-se constante na Campanha da Fraternidade, cuja primeira edição, em 1964, coincide com o início da ditadura militar no Brasil. "Num primeiro momento, era sempre uma reflexão sobre temas eclesiais e, com o passar do tempo, ela foi trabalhando questões sociais, a presença da Igreja no mundo e na sociedade." A mudança de abordagem, explica o padre, foi influenciada pelo Concílio Vaticano II, que teve início em 1962 e se estendeu até o final de 1965.

"Há um documento do Concílio, uma constituição sobre a pastoral chamada 'Gaudium et Spes', que diz que as alegrias e tristezas do povo de Deus são as alegrias e tristezas da Igreja. Então, os pastores da Igreja não podem e nem querem ser indiferentes a essa realidade por que passa o nosso povo. Nós vivemos a Campanha da Fraternidade como uma maneira concreta de praticar a caridade."

A reflexão que a Igreja promoverá durante a Quaresma também pretende pôr em xeque outro tabu: o de que religião e política não se discutem. "Dizem que 'a Igreja é para cuidar das coisas da sacristia, enquanto a sociedade cuida das coisas do mundo'. A Campanha da Fraternidade quer romper com esse mito e desconstruir a ideia de que nossa ação enquanto cristãos refere-se somente a dentro da Igreja. Não! Jesus nos envia em missão ao mundo: então nós evangelizamos não só dentro das igrejas mas no mundo da política, da cultura, da educação", afirma padre Kleber.

A definição de que "a política é a forma mais sublime de viver a caridade", continua o sacerdote, "é um ensinamento da Igreja presente desde o papa Pio XI e reforçado depois pelo Concílio Vaticano II, pelo papa Paulo VI". "Ela rompe com a mentalidade de que política é coisa ruim, com o qual o cristão não pode estar engajado; pelo contrário, deve encontrar no ambiente político a sua vocação e o serviço ao povo de Deus."

Padre Kleber lembra que a Igreja teve participação ativa na aprovação da Lei da Ficha Limpa (135/2010) e observa que a atuação do cristão na política não se encerra nas eleições. "Votar em candidatos que estejam aptos para a missão que irão receber é o primeiro passo. O segundo é ajudar as pessoas a compreenderem que o voto é um direito que elas têm; não imposição, mas um direito de construir, de modo livre e consciente, a democracia e fortalecer o bem comum. O terceiro é acompanhar os que são eleitos: a própria CNBB tem um acompanhamento dos trabalhos realizados no Congresso."

Nesse aspecto, completa o sacerdote, ganham destaque em âmbito municipal os portais de transparência e a participação nos eventos da Câmara. "Este é o desafio que fica para cada um: como colaborar na construção de uma sociedade mais justa e fraterna, sinal do reino de Deus? A política é um caminho. Talvez não o único, mas é um caminho seguro de encontrarmos cristãos conscientes do que é a vocação, o agir político de trabalhar pela sociedade."

"O que se espera de maneira geral não é apenas a criação de novas leis, pois já temos muitas, mas a efetivação dessas leis e o acompanhamento sério do investimento que o município faz nas diferentes áreas. Que a Câmara continue sendo essa Casa de todos, para que o povo encontre no representante no Legislativo uma orientação mais segura a respeito das questões", completa padre Kleber, destacando que o convite para estar na Câmara foi aceito "com alegria" pela Diocese de Piracicaba. "Estamos abertos para a acolhida de nossos representantes e também para a formação dessa sociedade que a Campanha da Fraternidade nos chama a construir."



Texto:  Ricardo Vasques - MTB 49.918


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