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10 DE DEZEMBRO DE 2020

Evento virtual debate acolhimento de mulheres vítimas de violência


Promovida por Nancy Thame, conversa pelo Facebook marcou o encerramento da edição de 2020 dos "16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres".



EM PIRACICABA (SP)  

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Conversa foi transmitida pelo Facebook



Um evento virtual marcou o encerramento dos "16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres", que desde 2017 faz parte do calendário de eventos da Câmara de Vereadores de Piracicaba. Autora do projeto de decreto legislativo que deu origem à celebração da data, Nancy Thame (PV) foi a anfitriã do encontro, transmitido por seu perfil no Facebook na tarde desta quinta-feira (10).

Prestes a encerrar seu mandato no Legislativo, Nancy comentou a satisfação de ter promovido atividades que proporcionaram reflexões sobre o papel da mulher na sociedade. "Vou sair no dia 31, mas tivemos a alegria de eleger quatro mulheres na Câmara, que, tenho certeza, vão abraçar essa agenda para contribuir com o Legislativo", afirmou, no início do bate-papo virtual.

A vereadora falou da origem dos "16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres", disse que as ações visam, senão zerar, "reduzir ao máximo" os ataques, abusos e discriminações contra o gênero feminino e chamou a atenção para a "dupla discriminação sofrida pelas mulheres negras, que estão na base da violência social e são as maiores vítimas".

"É uma mobilização anual e mundial, com diversos atores da sociedade civil engajados no enfrentamento. Essa campanha começou em 1991 e naquele momento 160 países já aderiram. Inicia-se em 25 de novembro, que é o Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher, e vai até o dia 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos", explicou.

Com tradução simultânea em libras feita por Juliana Alleoni, a enfermeira Elaine Zanatta, a psicóloga Juliane Martins de Oliveira e a promotora de Justiça aposentada Maria Christina Freitas expuseram cenários de seus locais de atuação e defenderam a importância da atuação em rede para a garantia de assistência a mulheres vítimas de violência.

Há 17 anos na DRS-X (Diretoria Regional de Saúde), que abrange a região de Piracicaba, Eliane ponderou que "o profissional de saúde muitas vezes não está preparado para discutir esse tema". "Ele está preparado para atender e dar assistência, mas não para discutir de que forma pode encaminhar isso dentro da rede. Temos ainda muito a trabalhar nesse sentido."

Eliane, que também atua como articuladora de saúde da mulher na DRS-X e é professora de enfermagem da Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba), disse que a maior parte dos casos que atende é de violência domiciliar, em que "o parceiro é o maior agressor", e que as cidades da regional passaram a fazer a notificação compulsória dos casos, como forma de ter uma visão geral da situação.

"Precisamos notificar para que consigamos fazer políticas públicas. Quando olhamos os dados e vemos que não se registra violência naquele município, então por que vou fazer programa conta a violência à mulher? Saber quem é o agressor também é importante para propor ações voltadas contra ele."

De acordo com a enfermeira, o ataque à mulher em uma relação "inicia-se muito antes da violência física". "Às vezes, o homem é autoritário, violenta essa mulher diariamente, na questão psíquica, cultural, de fazê-la se sentir vitimizada o tempo todo", comentou, acrescentando a necessidade de a rede de atendimento encarar que "o agressor também é doente". "Precisamos cada vez mais ajudar as mulheres a entenderem nosso papel na sociedade. Não precisamos ser submissas ou ficar reféns de um casamento, de um abuso psicológico."

Segunda convidada a interagir na conversa, Juliane distinguiu as etapas que caracterizam a violência doméstica. "Tem a fase da tensão, quando o homem começa a ter atritos por qualquer razão —porque viu uma mensagem no celular, porque a mulher está maquiada, porque ela resolve trabalhar fora—; a fase da explosão, com relatos de agressão física e tentativas de feminicídio; a fase do arrependimento, do 'Não vou fazer isso de novo'; e a fase em que a mulher se sente culpada, acha que provocou isso."

Com atuação em psicologia clínica, com abordagem humanista, e voluntária dos projetos "Psicopretas" e "Justiceiras", Juliane observou que o sentimento de culpa carregado pelas mulheres vítimas de violência é "efeito psicológico do abuso" e mais comum entre a população negra, que "está numa situação de vulnerabilidade".

A culpa é desencadeada por chantagens como "Seus filhos vão passar fome", perguntas do tipo "Como você vai educar sozinha?", pensamentos como "Devia ter cuidado mais da minha aparência para que ele gostasse mais de mim" e ameaças, como quando o homem "já passou pelo sistema prisional e fala que não quer voltar para lá", de modo que, se a mulher "fizer uma denúncia e levá-lo para a prisão, vai se sentir culpada pelo resto da vida, por afastá-lo dos filhos". "Enfim, é uma armadilha", resumiu Juliane, defendendo a necessidade de "orientar essas mulheres, acolher esse sofrimento".

Integrante do Conselho Municipal da Mulher, Maria Christina disse que é preciso "também trabalhar o homem, não só a mulher". "Não podemos ter essa visão compartimentada de que é só na relação familiar que o machismo se impõe, pois a violência de gênero no Brasil e no mundo é estrutural. Em determinado momento da história, passamos a dizer que os homens têm um valor maior que as mulheres."

Para a promotora de Justiça aposentada, o machismo na sociedade é estrutural "porque está formalizado". "Se olharmos para a nossa história legislativa, temos leis para dizer que as mulheres eram sempre relativamente incapazes, dependentes de uma figura masculina a vida toda; primeiro do pai, depois do marido. Você não podia exercer plenamente sua capacidade social, assinar um documento, trabalhar fora, porque isso era discriminado. O autoconceito da mulher fica lá embaixo e passa a considerar que o papel dela é cuidar da família e do marido, colaborando para que não consigamos tirar isso dentro de nós tão fácil assim."

Maria Christina defendeu a atuação da Rede de Atendimento e Proteção à Mulher em Piracicaba —"Foi muito importante porque trocamos experiências e olhares distintos para buscarmos soluções"— e a necessidade de uma atuação que conscientize o agressor. "O homem que viveu aquele momento não sabe encontrar recursos para mudar, não sabe nem de onde começar. Em grupos para homens agressores, conseguimos efetivamente ter um resultado positivo, trazendo essa reflexão e mostrando que existem formas diferentes de viver a relação familiar, afetiva. Temos que cuidar não só da mulher, mas trazer o homem para essa reflexão —mesmo os que não agridem, que também têm muitas falas machistas."

A promotora aposentada observou ser comum considerar como violência apenas a agressão física, relativizando o abuso psicológico, que "afeta a autoestima e a capacidade da mulher de reagir". "Para além de a mulher sair daquele relacionamento, ela precisa ter apoio para a reconstrução, porque senão é o que vemos: uma repetição de padrão, em que ela vai se envolver em outro relacionamento com a mesma dinâmica."



Texto:  Ricardo Vasques - MTB 49.918


Mulher Nancy Thame

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