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16 DE JUNHO DE 2023

‘Achados’: um carteiro muito louco, aprontando altas confusões


Em novembro de 1869, a Câmara reclamou de problemas recorrentes na entrega de correspondências por conta de um condutor embriagado



EM PIRACICABA (SP)  

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Condutor de correspondências, no Século XIX, lembra o personagem de filme da Sessão da Tarde



Um carteiro bêbado que quando não atrasa a entrega das correspondências chega até a perde-las no meio do caminho, causando problemas e reclamações. O enredo poderia ser de um filme da Sessão da Tarde – clássico programa da Rede Globo –, mas aconteceu na cidade no Século XIX, como registram ofícios da Câmara Municipal de Piracicaba apresentados na Série Achados do Arquivo desta semana. 

Em 12 de novembro de 1869, a Câmara Municipal de Vila da Constituição (a Piracicaba daquele período) encaminha oficio ao presidente da Província reclamando dos serviços prestados pelo funcionário dos Correios, que mais parecia um dos personagens do filme ‘Loucademia de Polícia’ (1984): 

“[...] está Câmara leva ao conhecimento de vossa excelência, primeiramente que, entregando-se a embriagues o atual encarregado da condução das malas de Campinas para esta cidade, tornam-se urgentes providências, para que seja despedido desse serviço, que será incumbido a pessoa de confiança, como sua importância exige. [...]” (em transcrição livre) 

O condutor trabalhara alcoolizado e causara problemas no trabalho. Vale pontuar que, no Século XIX, os condutores constituíam o serviço de entregas dos Correios e que, ainda naquele período, a empresa estatal estava sob a administração do então imperador Dom Pedro II.

Burros e outros animais de carga, como bois, mulas e jumentos, precisavam de condutores. Então, o trabalho exigia muito esforço físico mediante as péssimas condições das estradas. Mesmo assim, o responsável pelo serviço trabalhava com a mesma firmeza que o personagem-título de ‘Um morto muito louco’ (1989), como mostra outro ofício encaminhado pela Câmara, na época: 

“[...]. Em uma das últimas viagens, chegou a esta cidade (o condutor), sem dar conta de uma das malas que perdera em caminho e que felizmente encontrou depois. Diversas vezes tem-se deixado demorar nesta cidade, por achar-se naquele estado (referindo-se ao estado de embriagues), a ponto de se entregar as malas em Campinas, um ou dois dias depois do determinado, [...]” (em transcrição livre)

“É válido lembrar que o condutor atuava nos Correios, ou seja, sua postura deveria ser ilibada”, avalia Gabriel Tenório Venâncio, estagiário de História do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo da Câmara e responsável pela pesquisa. “Não sabemos quais rumos tomaram o condutor bebum, mas o problema com o condutor das correspondências voltou a ser citado nos documentos da Casa dois anos depois e acreditamos que seja o mesmo”, acrescenta, ao mostrar o ofício encaminhado pela Câmara em 23 de abril de 1871:

“[...] levamos ao conhecimento de vossa excelência, solicitando-lhe providencias a respeito, o fato de estar-se fazendo o serviço do correio para esta cidade com a maior irregularidade. A mala só chega aqui um dia depois daquele em que deveria ser entregue, e as vezes a noite, [...], quando ela foi entregue na agência as nove horas da noite, e o que é mais estranho, o seu condutor muitíssimo embriagado. [...]” (em transcrição livre, grifo nosso)

A secretaria da Câmara chega a oferecer as constantes chuvas como um álibi pelas dificuldades enfrentadas pelo condutor na condução das ‘malas’ (termo atribuído a encomendas e entregas), mas como o personagem de Leslie Nielson em ‘Corra que a polícia vem aí’, o responsável pela carga simplesmente não colabora e demonstra que, alcoolizado novamente, tropicava em suas próprias pernas:

“Enquanto duravam as chuvas, acreditávamos que os maus caminhos até certo ponto motivavam essa demora, [...] mas continuando a mesma irregularidade agora que os caminhos estão secos, chegavam a cabal conhecimento de que o condutor não é despachado a tempo daquela cidade, ou por culpa sua demora-se.” (em transcrição livre)

É, não tem como terminar de ler o caso do condutor e não imaginar uma variação do bordão-padrão da Sessão Tarde: “um carteiro muito louco, aprontando altas confusões”.

ACHADOS DO ARQUIVO - A série "Achados do Arquivo" é uma parceria entre o Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligado ao Departamento Administrativo, e o Departamento de Comunicação Social da Câmara Municipal de Piracicaba, para realizar publicações semanais no site da Câmara, às sextas-feiras, como forma de tornar acessível ao público as informações do acervo do Legislativo.



Texto:  Erich Vallim Vicente - MTB 40.337
Supervisão:  Rebeca Paroli Makhoul - MTB 25.992


Achados do Arquivo Documentação

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