15 DE DEZEMBRO DE 2021
Motivado por morte de ciclista no Município, debate reuniu representantes do Executivo, do Legislativo e de movimento na noite desta quarta-feira (15)
Audiência pública aconteceu no Salão Nobre "Helly de Campos Melges"
Convocada após a morte de mais um ciclista – em 22 de novembro – e às vésperas da revisão do Plano Municipal de Mobilidade – o qual deve ser encaminhado ao Legislativo até abril de 2022 –, a audiência pública na noite desta quarta-feira (15), no Salão Nobre “Helly de Campos Melges”, na Câmara de Piracicaba, apontou os desafios e entraves para o desenvolvimento da mobilidade ativa na cidade. Na ocasião, grupos e especialistas ligados à causa cobraram do Executivo mais efetividade na implantação de ciclovias.
“Temos que começar a inverter prioridades”, disse Silvia Morales (PV), do mandato coletivo “A Cidade É Sua”, autora do requerimento 1041/2021. “Há necessidade de investimento em infraestrutura, na qualidade e segurança dos transportes e no incentivo aos meios de mobilidade ativa”, enumerou, ao enfatizar “para que todos tenham direito à cidade”.
Mesmo com o anúncio da implantação de mais 15,3 quilômetros em três ciclofaixas no Distrito de Artemis e nos bairros de Santa Rita e Nova Piracicaba, a posição de grupos e especialistas da causa da mobilidade ativa – de meios de transporte não motorizados – é de que as vias aptas para uso de bicicletas devem estar interligadas às vias de acesso às principais regiões de adensamento do Município, possibilitando o uso por trabalhadores e estudantes, “os quais, no fundo, são os mais afetados”, observa Mirian Rother, especialista em Ecologia Aplicada e integrante do Funbea (Fundo Brasileiro de Educação Ambiental).
“O que está faltando é arrojo e vontade política para as coisas aconteceram”, disse, ao destacar, como demandas, a implantação de plano cicloviário com participação popular e programa de educação, “para aprendermos a compartilhar o espaço”, avalia, além do incentivo ao uso da bicicleta por trabalhadores e ações públicas para aumentar a visão popular sobre a mobilidade ativa, “como fechar ruas e avenidas aos finais de semana”.
Miriam defende que, para além do lazer, a bicicleta deve ser vista como meio de transporte. “Desenvolver ciclovias é dar segurança de transporte a uma faixa de trabalhadores de classes sociais com menor poder aquisitivo, os quais dependem disso”, apontou.
A posição é compartilhada pela educadora Ana Meira, do projeto USP Recicla, da Esalq. “Temos cerca de 400 estudantes que utilizam a bicicleta para o seu deslocamento”, disse. Ela pediu que o poder público “inverta a lógica” e não apenas atue em cima de demandas que já existem. “Precisa também estimular a população a ter a bicicleta como transporte”, disse, ao defender investimento na segurança para uso de veículo não-motorizado.
Representante do Coletivo Mais Ciclovias Piracicaba, Alessandra Ribeiro defendeu que os investimentos em ciclovia devem dar efetividade no uso da bicicleta como meio de transporte. "Espero que (as novas ciclofaixas anunciadas) não sejam apenas para cumprir uma estatística”, disse, em referência ao plano de 40 km de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas definidas a serem implantadas nos próximos quatro anos pela Administração.
Ela reconhece que o Executivo tem demonstrado interesse e abertura para dialogar em torno da demanda do grupo, mas pediu que as ciclovias sejam interligadas. “Não queremos conflito, essa não é a nossa intenção, mas estamos trazendo nossas necessidades”, disse, ao pedir que os investimentos sejam feitos “de forma adequada”.
DEMANDAS - Também surgiram apontamentos em torno da capacitação sobre a mobilidade. “Todo mundo no trânsito tem seu papel, o ciclista tem suas obrigações, mas o condutor também tem, por isso entendo como fundamental a educação”, disse Valéria Penatti, outra integrante do Coletivo Mais Ciclovias. Ela relatou a intenção do grupo em desenvolver projetos em cursos de formação. “Temos vários que estão engavetados e estamos morrendo de vontade para dividir com a população”, disse.
Representante do Oscip Pira21, o advogado Jonas Parisotto destacou que a mobilidade ativa, com veículos não-motorizados, está diretamente ligada com as questões ambientais. “Dos 17 pontos dos objetivos para o desenvolvimento sustentável, a bicicleta está presente em todos”, disse, ao lembrar dos princípios anunciados durante a Eco-92. “Nós, ciclistas, sabemos o quanto é perigoso pedalar em Piracicaba e também sei que existem excelentes projetos que podem ser implementados, só falta vontade política”, disse.
O engenheiro João Dimas pontuou que “investimentos em ciclovias não devem ser feitos a toque de caixa” e destacou que “envolve principalmente infraestrutura da cidade”, ao lembrar de problemas como frequentes alagamentos em regiões centrais do Município. Ele observou que R$ 30 milhões previstos para serem investidos em ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas em quatro anos, conforme anunciado pelo Executivo, “não nem para o início”.
Proprietário da S2 Bike Shop, Paulo Roberto pediu “mais segurança” nas ciclofaixas da Rua do Porto e nas ciclovias da avenida Renato Wagner. “Acho que nos finais de semana podemos pensar em utilizar faixas exclusivas para bicicletas em avenidas”, defendeu.
Walter Koch, do MCCP (Movimento de Combate à Corrupção de Piracicaba), disse que é pouco o dinheiro previsto no PPA (Plano Plurianual) 2022-2025 para investimentos em educação no trânsito. Ele também disse que os recursos para implantação de ciclovias podem sair da arrecadação com multas, conforme legislação do Contran.
O professor Juan Sebastianes, da ComClima, lembrou que a mobilidade não-motorizada contribui para a redução de acidentes no trânsito, assim como para a melhoria da saúde das pessoas e a redução da emissão de gases poluentes na atmosfera. “Eu vejo isso com muita importância, algo que eu sempre me preocupei”, disse, ao apontar a necessidade de revisão do Plano Municipal de Mobilidade. Ele também fez críticas a investimentos já realizados na cidade. “A ciclofaixa da Rua do Porto é um erro enorme”, disse.
VEREADORES - A vereadora Ana Pavão (PL) lembrou que já discutiu a questão da ciclovia da avenida Laranjal Paulista, no Campestre, e destacou o interesse em “ouvir e construir junto algo bom”, destacou a parlamentar que também é signatária do requerimento 1041/202, ao lado de Silvia, Thiago Ribeiro (PSC) e Zezinho Pereira (Democratas).
“É um tema importante para a nossa cidade, que é a questão da mobilidade, tenho pouco para falar aqui, porque quero dar mais a oportunidade de vocês falarem”, disse Ribeiro.
O vereador André Bandeira (PSDB) observou que a melhoria do transporte no Município contribuiu para pessoas com mobilidade reduzida. “É importante proporcionar essa opção a essas pessoas, e isso precisa ser implantado em nossa cidade”, disse.
Presidente do Fórum de Educação para o Trânsito, o vereador Gustavo Pompeo (Avante) apontou que a capacitação em torno da mobilidade “salva vidas e encurta distâncias”. “Eu sou motoboy de profissão e por isso eu tenho isso como uma bandeira política”, disse.
A vereadora Rai de Almeida (PT) defendeu que as ciclovias devem ser olhadas como uma opção de transporte aos trabalhadores e estudantes. “Devemos ver esse tema a partir daqueles que usam a bicicleta como meio de locomoção”, disse, ao pedir que, ao invés de fazer “a escolha pelo turismo”, o poder público primeiro priorize essa população.
EXECUTIVO - A secretária municipal de Mobilidade, Trânsito e Transportes, Jane Franco Oliveira, detalhou a proposta da Administração para ampliação das ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas, previstas para serem cerca de 40 km em quatro anos, “mas é claro que pode ser mais”, disse. Dos R$ 30 milhões previstos no PPA 2022-2025 para o setor, ela lembra que somente R$ 2 milhões são do tesouro municipal, o restante deverá ser buscado a partir de emendas e outros tipos de repasses, como programas federais de investimentos.
Jane também destacou que as ciclofaixas recém-anunciadas contemplam projetos que já existiam na Semuttran e que agora foram viabilizados. Serão 8,7 km no bairro Santa Rita, 4,3 no Distrito de Ártemis e 2,3 km na avenida Paulista, no bairro Nova Piracicaba – e que será integrada com a ciclovia da avenida Cruzeiro do Sul.
“A gente tem que fazer tudo certo, olhando para todo o espaço, lembrando que mobilidade não é só a bicicleta, mas são os outros transportes também”, disse, ao anunciar que a Semuttran irá contratar serviços para estudos e projetos e novas ciclovias.
Diretor-presidente do Ipplap (Instituto de Pesquisa e Planejamento de Piracicaba), Daniel Rosenthal destacou que a cidade, quando foi planejada, definiu o tamanho das vias a partir de carroças. “Temos um relevo bastante complicado e muitas questões urbanísticas, de construções, já consolidadas”, apontou. Ao mesmo tempo, ele disse que “não é inimigo dos ciclistas” e pediu trabalho em conjunto para “buscar possíveis mudanças”.
O secretário municipal de Obras, Paulo Ferreira, destacou que o meio de transporte “é um bem comum, uma forma de interagir”, destacou, ao lamentar que a audiência pública tenha sido motivada a partir de uma “fatalidade e de uma tragédia". “A Semob está em sintonia com a Semuttran, utilizando a área técnica para desenvolver um trabalho bacana”, disse, ao acreditar que a cidade irá “colher os frutos” desta parceria.
Diretora do setor de turismo da Semdettur, Rose Massarutto destacou o projeto de ciclorrotas como incentivo ao turismo rural. Ela disse que, embora voltadas ao lazer, estas vias são interligadas com outras ciclovias do Município. “Estamos elaborando as rotas do Horto de Tupi, de Jupiá-Artemis, Laranjal-Saltinho, Tanquinho e Rota Tirolesa”, informou. A proposta é oferecer estrutura de passeio, com informações, e também com base de apoio aos ciclistas. “Muitas destas vias já recebem turistas e a nossa preocupação é aproveitar todo o que já existe nelas, como produtores que vendem nesses locais”, destacou.
A audiência pública também contou com a participação do vereador Fabrício Polezi (Patriota) e do secretário municipal de Governo, Carlos Beltrame.