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25 DE AGOSTO DE 2021

Audiência aponta preocupação com ordens de despejo no “pós-pandemia”


Vereadores cobram medidas para atender população de ocupações com reintegração de posse já expedida pela Justiça.



EM PIRACICABA (SP)  

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O cumprimento de reintegração de posse, já expedidas pela Justiça, sobre ocupações em Piracicaba no período “pós-pandemia” pautou audiência pública na tarde desta quarta-feira (25), na Câmara Municipal de Piracicaba, convocada pelo vereador Gustavo Pompeo (Avante), autor do requerimento 701/2021. “O que acontecerá se essas ordens de despejo forem executadas simultaneamente”, questionou o parlamentar, que cobrou soluções, como a possibilidade de desapropriação, direito de preempção (preferência do Município para compra do imóvel), arrecadação de imóveis abandonados, dentre outras medidas. 

Pompeo trouxe os números mais recentes sobre a habitação no Município, com 252 loteamentos irregulares, sendo 76 núcleos sociais e déficit de 10 mil moradias. “E vale lembrar que estes dados podem estar desatualizados, já que cresce a cada dia”, pontuou. 

São quatro ocupações já com ordem de reintegração de posse expedidas pela Justiça: Comunidade Renascer, a maior delas, formada desde 2019, conta cerca de 400 famílias; Esperança, instalada em um terreno cujo proprietário tem multa de quase R$ 1 milhão de IPTU, tem aproximadamente 496 famílias; Vitória, iniciada em 2017, com 700 pessoas; e Lado Negro, com processo que já corre na Justiça, “e da qual não obtivemos muito mais informações, porque estão sob os cuidados do advogado dos moradores”, disse Pompeo. 

“São núcleos populosos, para os quais devemos discutir não apenas moradia, mas moradia digna”, enfatizou Pompeu, ao defender que o primeiro passo é entender o que o governo municipal está fazendo para evitar que problemas causados pela reintegração ocorram. 

Engenheira civil e com experiência de atuação na Emdhap (Empresa de Desenvolvimento Habitacional de Piracicaba), a vereadora Silvia Morales (PV), do mandato coletivo “A Cidade É Sua”, defendeu que é preciso “fazer valer” a função social da propriedade, prevista na Constituição Federal. “Se a área estava vazia, desocupada, com dívida, então a gente pode tentar, juntos, pensar em algum instrumento”, disse, ao defender que é preciso diferenciar a população que precisa de moradia de que realiza loteamento irregulares. 

A vereadora Rai de Almeida (PT) lembrou que, embora exista um marco legal para regularização fundiária, o qual determina que só imóveis até o final de 2016 poderão passar por esse processo, “ele não é fechado em si mesmo”, destacou, lembrando que a garantia de moradia digna à população também passa por outras legislações, como Estatuto da Cidade e Código Civil. “Além disso, há interpretações diferentes entre ministérios públicos de cada estado, sobre os quais precisamos buscar entender”, disse. 

Ao defender uma “discussão em cima da realidade” que a população em área ocupada vivencia, o vereador Paulo Camolesi (PDT) sugeriu a criação de um grupo de trabalho para acompanhar os casos. “Se a gente conseguir fazer um grupo de estudo, junto com a comunidade, com o Poder Judiciário, e ver a realidade onde se pode caminhar, daí as próprias lideranças, como representantes das comunidades, contribuem para fazer acontecer. Do contrário, a gente vem aqui, e fica apenas fazendo reunião”, disse. 

Os vereadores Acácio Godoy (PP) e Thiago Ribeiro (PSC) destacaram a necessidade de ter informações mais precisas sobre a situação. “Política pública a gente faz com base em dados, então minha questão é se há censo destas comunidades”, disse Godoy. Já Ribeiro, cobrou o atendimento a critérios, como tempo de moradia na cidade, para que a população possa ser atendida pelos serviços disponíveis. “É importante ter critérios”, disse.

Também foi cobrada maior fiscalização para evitar ocupações em áreas do município. “Eu fico muito preocupado, porque Prefeitura não fez uma fiscalização efetiva para não acontecer do pessoal ir morar nestes locais e agora quer tirar as pessoas destes locais e vão para a rua”, questionou Zezinho Pereira (Democratas). Na mesma linha, Fabricio Polezi (Patriota) cobra “ação mais efetiva”. “Quando o primeiro barraco entrou, (a Prefeitura) já deve entrar com o posicionamento de autoridade policial no tocante às invasões”, disse. 

Ana Pavão (PL) também cobrou um “plano para prevenir invasões” e, agora, no caso de reintegração de posse ela questiona o que será feito. “Vamos tacar o trator por cima? A terra tem dono, mas estava sem uso, e o morador, vai para onde”, questionou. 

O vereador Anilton Rissato (Patriota) classificou como a situação como “herança” da administração anterior, “com 10 mil famílias de déficit habitacional”, salientou. “É um trabalho que vai exigir muito do atual presidente (da Emdhap)”, destacou, e afirmou que embora seja contra invasões, é preciso reconhecer que é “uma realidade”. 

Cassio Luiz Barbosa, o Cassio “Fala Pira” (PL), também apontou características de atuação da Emdhap, “que sempre foi uma máquina de fazer voto”, destacou. “Reintegração de posse é muito triste, porque as famílias não têm para onde ir, e estamos falando de famílias com idosos, crianças, pessoas doentes, por isso precisa atuar antes”, concluiu.

EMDHAP – O presidente da Emdhap, Sérgio Chaim Maluf procurou estabelecer, como ele próprio salientou, “uma conversa franca”, e pontuou as limitações da empresa pública diante da decisão do Poder Judiciário em torno das ocupações. “A gente tem procurado pautar a nossa administração por ações legais, a gente quer fazer tudo dentro da lei”, disse, ao salientar que há limitações quanto a recursos. “Não temos dinheiro para resolver tudo.” 

“As áreas particulares ocupadas têm dono e nós temos a Justiça para julgar, por isso não adianta achar que vai ter uma solução de curto prazo, se a gente ficar se enganando, vamos empurrar o problema com a barriga e mais tarde vai estourar”, disse Chaim Maluf. 

Ele lembrou que o está segurando a efetivação dos processos de reintegração de posse é a pandemia (por conta de uma decisão do STF, que prorrogou, desde junho, por seis meses essas medidas no País). “Mas já estão avançados, alguns já transitados, e não é um problema apenas de Piracicaba, mas do Brasil de uma maneira geral”, acrescentou, ao propor que sejam trabalhos “pontos de possibilidade, para que a gente amenize isso”, embora tenha sido enfático ao dizer ser difícil reverter as decisões judiciais. 

Quanto a propostas de desenvolvimento da política habitacional do Município, Chaim Maluf destacou que a Emdhap vem trabalhando na atualização do cadastro dos mutuários, sobretudo por conta do alto grau de inadimplência dos imóveis, que chega a 80%, e ainda prevê uma revisão no Plano Diretor do Município, em vigência desde o ano passado, para que seja possível “produzir lotes”, ao invés de moradia, tornando o procedimento de benefício às famílias de forma mais ágil e ainda mais barata.

“A gente tem feito benfeitorias em diversas comunidades, mas algumas tem ruas com menos de um metro de largura, mal entra um caminhão de emergência, porém queremos chegar em um ponto em que as ruas sejam regularizadas”, destacou 

SMADS – A secretaria municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Euclidia Fioravante, detalhou o atendimento realizado no âmbito do SUAS (Serviço Único de Atendimento Social), em que possível promover os benefícios às famílias mais necessitadas. No entanto, ela apontou a dificuldade de introduzi-las no Cadastro Único do Governo Federal (CadÚnico), sistema pelo qual é feita a organização da população que deve ser contemplada tanto com serviços municipais quanto de outras esferas de governo. 

São 1.777 famílias de ocupações com dados no CadÚnico, informou Euclidia, ao apontar que é um percentual baixo. “Vale lembrar que mais da metade desta população é de fora de Piracicaba, que é um fenômeno que precisamos entender porque acontece”, disse. 

“Em relação à reintegração de posse, a Smads não pode fazer nada, o CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) estará aberto para informações, até porque, de forma legal, não podemos atuar junto com forças coercitivas”, disse, ao defender que é preciso trabalhar com as famílias destes locais previamente.

“O foco é orientar as famílias para que façam o Cadastro Único e assim serem incluídas nos programas existentes, incluindo o chamado “recâmbio”, em que a Prefeitura contribui para a família retornar para a cidade de origem. “Se tem algumas famílias que desejam voltar para a cidade de onde vieram, nós podemos ajudar nesta situação”, destacou. 

LIDERANÇAS – Também participaram da audiência pública, como convidadas, lideranças de algumas das comunidades que estão sob o risco da reintegração de posse. Juliana Oliveira, da Renascer, disse que, quando a área foi ocupada, a Emdhap sabia que estavam lá e que os próprios moradores realizaram o cadastro. “Não temos o básico, então não temos como saber quem já foi contemplado (em algum programa de habitacional social)”, disse, ao destacar que se há algum sistema de venda irregular, ela não tem conhecimento. “O que estamos fazendo é lutar pelo nosso direito à terra”, enfatizou.

Jaime Pereira, da Comunidade Esperança, lembrou que os herdeiros da área onde está a ocupação “não tinha ciência da terra” e que só tomaram interesse após a busca de uma construtora que agora busca realizar um empreendimento. “Agora, eles estão loucos para que a gente saia”, disse. Ele que a reintegração de posse seja “desacelerada” para que a comunidade, junto com a Prefeitura, encontre uma solução para os moradores.



Texto:  Erich Vallim Vicente - MTB 40.337
Supervisão:  Rodrigo Alves - MTB 42.583


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