"A proposta visa caminhos que devemos seguir para começar a construir um conjunto de indicadores da violência de gênero contra as mulheres no município", disse Danielle
A advogada popular, integrante do Coletivo Feminista "Marias de Lutas", Danielle Martins Godoi ocupou a Tribuna Popular da Câmara de Vereadores de Piracicaba, na 51ª reunião ordinária de ontem (10) para abordar a temática: Coleta de dados para enfrentamento à violência contra as mulheres, ocasião em que apresentou estudos que apontam o crescimento de violência contra as mulheres, onde Piracicaba consta do ranking dos 20 municípios do Estado de São Paulo, segundo dados do Ministério da Saúde, com o maior número de óbitos femininos por agressão, totalizando 142 casos.
"Vamos enfrentar com coragem a violência contra a mulher no município! Se tem problema, vamos para cima, vamos resolver! Precisamos, juntos, enfrentar e rever o que queremos para nossa vida e para nosso país", defendeu a feminista.
A vereadora Nancy Thame (PSDB) cumprimentou a oradora e disse que muitas mulheres têm participado de debates na Câmara, em discussões que têm sido essenciais, independentes de corres partidárias. Além de citar a realização de eventos como a Semana da Mulher e da Rede de Atendimento à Mulher Vítima da Violência, o que agregou várias instituições, em diferentes vozes; bem como defendeu a necessidade de uma pesquisa mais elaborada para que tenhamos medidas assertivas nas políticas públicas do município. Nancy também comentou sobre estudo ao procurador geral do município, por meio do Ipplap, sendo que o Executivo recebeu com boa vontade e isso deve andar.
A vereadora Adriana Cristina Sgrigneiro, a Coronel Adriana (PPS) disse que tem tratado de questões práticas que vão permitir a medição de resultados. Anunciou para o dia 14, às 15h, reunião com o diretor do Fórum para unificar os processos relacionados à mulher em uma única vara, o que deverá otimizar o trabalho da DDM e da Patrulha Maria da Penha.
O vereador Lair Braga (SD) reforçou que o país é o quinto no mundo no mapa da violência contra a mulher. Citou a morte de Marielle Franco e a falta de apuração do crime. "Muito se fala em Maria da Penha e em medida protetiva, mas precisamos da prática. Quantas mães sofrem violência e não recebem pensão alimentícia? É preciso sair do discurso e irmos para a prática", disse.
O vereador Osvaldo Airton Schiavolin, o Tozão (PSDB) também fez considerações na fala de Danielle Martins. "Quero deixar claro que a solução para esse problema é a educação de berço. Estamos acabando com as nossas famílias, literalmente estamos dilacerando as nossas famílias, que estão se transformando em pesadelo. Falta Deus no coração das pessoas e essa luta também é do Tozão", disse.
O vice-presidente da Câmara, Ronaldo Moschini (PPS) também considerou o quadro de violência praticado contra as mulheres. "É questão de princípio. Aprendíamos que tínhamos que proteger as irmãs dentro de casa. Não se coloca a mão em uma mulher. Ninguém coloca a mão em uma irmã nossa, porque os pais ensinavam a proteger. A educação vem de casa, não da escola. Antigamente os filhos se educavam nas casas. Muitas coisas estão se invertendo", disse o parlamentar, que também considerou que falta nas casas o ensinamento religioso, dos pais levarem as crianças para as igrejas, em qualquer religião.
Para Moschini, todas as igrejas ensinam coisas boas. "A maior recuperação com problemas está na igreja, é Deus que recupera um número grande de pessoas. O que falta é o ensino religioso", disse.
Temática
Na discussão temática, Danielle Godoi também se baseou em artigos científicas para referendar suas reflexões sobre o quadro agravante da situação da mulher na contemporaneidade.
A consideração é que atualmente contamos com legislações e estudos que vêm demonstrando que a violência contra a mulher é um grave problema social com dimensões epidêmicas. O aumento exorbitante desta violência levou a situação insustentável de ocuparmos o 5° lugar no ranking dos países que mais matam mulheres no mundo.
Segundo o Mapa da Violência 2015: Homicídio de mulheres no Brasil, entre 2003 e 2013, o número de mulheres mortas em condições violentas passou de 3.937 para 4.762 – o que representou 13 feminicídios por dia –, registrando um aumento de 21% na década.
Para as mulheres negras, o índice foi ainda pior: os homicídios, nesse caso, aumentaram 54,2% no mesmo período, passando de 1.864 para 2.875 vítimas. (Waiselfisz, 2015)
Tendo em vista esse hediondo cenário nós, da sociedade civil organizada, entendemos que é urgente a necessidade de se criar mecanismo qualificados, não apenas atenção as sobreviventes das violências contra a mulher, mas também necessitamos de políticas de prevenção e de promoção de qualidade de vida, saúde e segurança para as mulheres em nossa sociedade, sabendo que estas mortes são evitáveis e que a negligência e omissão do Estado gera ambiente propício para sua continuidade e crescimento.
Além disso é importante ressaltar que estas mesmas mortes evitáveis de mulheres são apenas a ponta do iceberg, que esconde imerso no silêncio uma multidão de vítimas ocultas da violência contra a mulher.
É muito importante que possamos acompanhar, diagnosticar e monitorar a violência contra a mulher a fim de conseguir entender de maneira complexa este grave problema social e assim aplicar de forma mais efetiva as leis de gênero, que o país já vem elaborando, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio.
Desta forma, a produção de estatísticas sobre o tema são ferramentas necessárias e indispensáveis no planejamento que permita a visibilização da problemática da violência. Além de serem insumos fundamentais para elaborar políticas públicas ajustadas às necessidades da população afetada.
"Assim, a proposta aqui apresentada visa demonstrar que caminhos devemos seguir para começar a construir um conjunto de indicadores da violência de gênero contra mulheres em nível intramunicipal, bem como uma justificativa do porquê tal método deve ser empregado", defendeu Danielle.
"É nesse sentido que caminha a proposta aqui apresentada, em outras palavras, queremos iniciar o levantamento de dados e a investigação científica sobre a violência contra as mulheres em nosso município, objetivando conhecer nossa realidade para a criação de intervenções e políticas públicas qualificadas", enfatizou.
A consideração é que o município de Piracicaba está entre os 20 municípios do Estado de São Paulo que mais registrou óbitos femininos por agressão na soma de todos os óbitos ocorridos de 1996 a 2016, conforme fonte do Ministério da Saúde, datasus, tabulações Jackeline Romio.
Estes dados só puderam ser compilados através do registro dos casos através da Notificação Compulsória PORTARIA NO - 204, DE 17 DE FEVEREIRO DE 2016 do Ministério da Saúde.
Apesar da tabulação descrita a partir do sistema de informação do MS, é sabido que a violência contra a mulher no município, não pode ser mensurada apenas a partir de um único serviço/órgão de atendimento.
Em março deste ano a Câmara de Vereadores de Piracicaba, através das vereadoras Nancy Thame e Adriana Cristina Sgrigneiro Nunes (Coronel Adriana), juntamente com o Conselho Municipal da Mulher, instituíram o grupo de trabalho Rede de Atendimento à Mulher em situação de violência.
O Grupo tem como foco a implementação de uma Rede de Atendimento que englobe diverso órgãos/setores governamentais que realizam o atendimento às mulheres (SEMDES, Saúde, GCM - Patrulha Maria da Penha, DDM - Delegacia da Mulher, Defensoria Pública, Ministério Público, Câmara de Vereadores - Procuradoria Especial da Mulher e Fórum) órgãos não-governamentais (CasVi - Centro de Apoio e Solidariedade a Vida) e a sociedade civil organizada ( coletivo de mulheres Marias de Luta e Promotoras Legais Populares), a fim de se articular políticas públicas afirmativas voltadas à mulher vítima de violência.
A ausência do diálogo entre estes serviços, foi um dos impasses levantados por este grupo de trabalho. A falha no fluxo dessa rede, através da inexistência de um sistema de dados único para o atendimento destas mulheres, acaba por incidir na impossibilidade de se pautar por novas políticas públicas afirmativas e na manutenção efetiva das políticas existentes.
Nesse sentido apontamos que atividades de pesquisa no campo da violência contra a mulher bem embasadas e com olhar específico para a questão de gênero, com a contratação de especialista e acesso aos dados de saúde em nível intramunicipal significará um grande avanço para a cidade de Piracicaba, uma vez que ela pode ser o local no qual tais defasagens passam a ser superadas, colocando-se assim numa posição de vanguarda na abordagem e combate à violência contra a mulher em nosso país.
Tal pesquisa contaria com a supervisão e insumos dos movimentos sociais organizados, que podem contribuir com as questões locais a partir de experiências já trabalhadas dentro militância no enfrentamento à violência contra a mulher e atenção às vítimas.
Nesse sentido, é importante pensarmos na ideia de promoção de saúde e qualidade de vida, que segundo assinalado na Carta de Otawa de l986 “é o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da qualidade de sua vida e saúde incluindo maior controle desse processo”.
Para tanto, consideramos fundamental que se invista com urgência no levantamento, coleta e análise dos dados relacionados à violência contra a mulher, sendo este, como já apresentado, um ponto essencial para a promoção de políticas públicas de qualidade.
"Tal questão nos preocupa de maneira fundamental, pois apesar de ser, como já apresentada aqui, uma prática essencial, acaba muitas vezes por ser desconsiderada.
Nunca é demais ressaltar que mesmo já existindo pesquisas em localidades outras ou na esfera nacional que nos revelam fatos a apontam tendências no que diz respeito a violência perpetrada contra as mulheres, é fundamental que tal ação seja tomada dentro da municipalidade, uma vez que, outros trabalhos apresentados pouco nos revelam como tal movimento se dá na cidade de Piracicaba, como por exemplo, em quais bairros isso incide de maneira mais intensa; ou seja, pesquisas genérica ou de outras localidades não conseguem abranger as especificidades sociais, culturais e econômicas da cidade. Prevemos um estudo que combine a abordagem da saúde e sua interface com a segurança pública", relatou Danielle.