27 DE NOVEMBRO DE 2024
Realizada no Plenário da Câmara na tarde desta terça-feira (26), audiência contou com a participação de Alexandre Motta, presidente da Funasa (Fundação Nacional de Saúde)
Audiência pública aconteceu na tarde desta terça-feira (26), no Plenário "Franscisco Antonio Coelho"
As complexidades e os desafios associados à ampliação do saneamento básico no Brasil foram debatidos em audiência pública realizada na tarde desta terça-feira (26), no Plenário da Câmara Municipal de Piracicaba. O evento contou com a participação de Alexandre Motta, presidente da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), ligada ao Ministério da Saúde.
A audiência foi solicitada e presidida pela vereadora Rai de Almeida (PT), e também contou com a participação da vereadora Silvia Morales (PV), do mandato coletivo A Cidade é Sua, assessores parlamentares, e representantes da Guarda Civil Metropolitana de Piracicaba e da Comclima (Comissão Municipal de Mudanças Climáticas).
"Temos um problema de coleta e tratamento de esgoto na cidade, embora haja um discurso de que há 100% de coleta e tratamento. Na realidade, o que vemos, é apenas e tão somente o discurso. Nós temos, ainda, muito esgoto jogado a céu aberto. Temos [também] problema de falta de água, e esse não é um problema apenas de Piracicaba, mas algo que pode ser acentuado com a crise climática”, disse Rai de Almeida na abertura do evento.
Água é vida - Alexandre Motta, no início de sua exposição, destacou com um "clichê” a importância da água potável na manutenção da vida e das sociedades: “ninguém vive três minutos sem respirar nem três dias sem beber água potável. Esse deve ser o senso de urgência de todos nós. Água potável é vida”.
Após reforçar a centralidade da importância do acesso a fontes de água potável, Motta destacou que o saneamento básico é um conceito mais amplo, para além da água potável, que também abrange ações voltadas ao tratamento de esgoto, à gestão dos resíduos sólidos e ao escoamento das águas pluviais.
“Além da água potável, o saneamento é mais amplo. O saneamento não se resume à produção de água potável em si, mas ele também está conectado com essas três outras dimensões, que têm relação direta com a água”, disse.
Saneamento urbano e rural - Após conceituar as linhas gerais do que se entende como saneamento básico, o Presidente da Funasa fez uma distinção entre saneamento urbano e saneamento rural.
“Existe uma diferença fundamental entre saneamento urbano e saneamento rural. Não são a mesma coisa. A gente costuma sempre falar de modo muito genérico, saneamento. Chamo atenção especificamente para essa diferença pois eles são completamente diferentes do ponto de vista como nós podemos enfrentá-los”, falou.
A diferença, de acordo com Motta, reside fundamentalmente na escala. Ao passo que o saneamento urbano possui caminhos e diretrizes amplamente conhecidos, tradicionais, como a estruturação de redes de coleta e tratamento de água e esgoto, o saneamento rural possui particularidades e individualidades que precisam ser levadas em conta, demandando soluções diferentes em diferentes localidades, até mesmo únicas para determinadas realidades.
Com um maior adensamento de pessoas e estruturas em um mesmo espaço, explica o Presidente da Funasa, a instalação ou ampliação das chamadas estruturas convencionais de coleta e tratamento, seja de água e esgoto, de resíduos sólidos ou de águas pluviais, tende a ter um custo menor quanto comparado à adoção de medidas mais pontuais e isoladas, como as demandadas, por exemplo, no meio rural ou em localidades urbanas com menor número de habitantes.
“O Brasil tem 5570 municípios, além do Distrito Federal. Destes municípios, 4914, ou seja, 85% dos municípios brasileiros, têm menos de 50 mil habitantes. São municípios cuja escala operacional é relativamente baixa para se obter retorno econômico do uso de água, do esgoto, da gestão de resíduos sólidos etc. Colocando de outra forma, não dão lucro, pois a escala é muito baixa. Só os municípios com escala em torno de 200 mil habitantes passam a ser municípios com potencial econômico de exploração”, explicou Alexandre Motta.
“Via de regra, o grande desafio no Brasil não são os grandes aglomerados urbanos de alta concentração, mas o saneamento chamado de rural, com baixa concentração e alta dispersão territorial”, acrescentou.
O papel do Estado - Frente a um cenário em que a estrutura de ocupação do território impacta na oferta e na exploração econômica de serviços ligados ao saneamento, resta ao Estado, que não deve se ater estritamente a uma mentalidade economicista, segundo Motta, atuar neste processo:
“Se não compreendermos esses elementos diferenciadores entre o urbano e o rural, não perceberemos que a solução para o rural está vinculada, essencialmente, ao dinheiro público. Se não for este dinheiro público, não será dinheiro nenhum, pois outras alternativas, pensando em lucro, são totalmente inviáveis no setor rural. É uma obrigação do Estado satisfazer essa necessidade de todos os cidadãos brasileiros, seja na cidade, seja no campo, seja na floresta, seja nas águas”, falou.
Ele continuou: “água e os outros elementos do saneamento são instrumentos civilizatórios. Nós precisamos de saneamento porque todos nós, enquanto seres humanos, precisamos de qualidade de vida e saúde. E o saneamento é um instrumento fundamental para a garantia de qualidade de vida e saúde. Essa é a missão fundamental da Funasa, operar, discutir, debater e trabalhar o saneamento básico, no plano urbano, em cidades com menos de 50 mil habitantes, e na questão do saneamento rural, para todos os municípios do Brasil, inclusive para Piracicaba”, destacou o Presidente, que na sequência citou a possibilidade de apresentação de projetos quando da abertura de eventuais editais da Fundação.
Motta, no entanto, acrescentou: “Piracicaba, para a zona rural, pode apresentar um projeto para o tratamento de água, desde que não seja com uma operadora do serviço de água e esgoto privada, porque, em tese, a empresa privada terá recursos próprios auferidos a partir das tarifas”.
Plano Municipal de Saneamento Básico - Além de atuar por meio de editais de recursos não onerosos, ou seja, não reembolsáveis, a Funasa, destaca Alexandre Motta, também tem como um de seus objetivos o auxílio a municípios na elaboração de planos voltados ao saneamento básico, tanto em áreas urbanas quanto rurais, inclusive com a disponibilização de termo de referência e manual de elaboração de plano de saneamento básico rural na biblioteca digital da instituição.
Preocupações - Por fim, Alexandre Motta também trouxe dados que demonstram uma queda percentual dos recursos do Orçamento Geral da União no saneamento básico na última década. Se em 2013 foram empregados 0,04% (R$ 71,320 bilhões) do orçamento, em 2022 foram aplicados 0,0072 (R$ 29,2 bilhões) e, já em 2013, o percentual foi ainda menor: 0,0034 (R$ 14,8 bilhões).
“Nós temos uma tremenda preocupação pela frente, de ampliar esses recursos. É óbvio que houve uma mudança de eixo público para o privado, mas não tivemos a recuperação daqueles 71 bilhões, com certeza”, disse Alexandre Motta ao mencionar o cenário advindo do Marco Legal do Saneamento.
“O saneamento é um pilar muito importante em um país onde 33 milhões de pessoas ainda não têm acesso a água potável. Aqui, no município, estamos passando por uma crise de abastecimento de água grande, e as discussões aqui na Casa têm sido recorrentes sobre isso. Em diversos bairros há falta d’água. A PPP do esgoto, que vem há tempos, a PPP do lixo, são heranças bem difíceis de lidar, e estamos debatendo essas situações”, disse a vereadora Silvia Morales, que frisou que Piracicaba conta com extensa área rural, em boa parte com loteamento irregulares, com características urbanas. Ela também destacou que o Plano Municipal de Saneamento encontra-se em fase de revisão pelo Executivo, e cobrou celeridade no encaminhamento do documento para debates e apreciação pelo Legislativo.
“No Brasil, ainda temos mais de 24% da população que não tem água potável e saneamento básico, e parte desse contingente está aqui em Piracicaba”, falou a vereadora Rai de Almeida, que também cobrou celeridade na revisão e encaminhamento ao Legislativo do Plano Municipal de Saneamento, além de outras revisões de planos administrativos.
“Fica para nós o desafio de continuarmos o debate, de fazer com que os governantes, aqueles que estão em cargos políticos de destaque, se sensibilizem. A nós, aqui da Câmara, cabe cobrar o Plano de Saneamento Básico, em elaboração, e cobrar outros instrumentos, como o Plano Diretor, que termos que fazer atualizações, além de cobrar outras questões, do próprio Semae, relacionadas ao recursos hídricos, ao tratamento e o abastecimento de água para a população que está em uma situação bastante delicada”, finalizou Rai de Almeida.
A audiência pública pode ser revista, na íntegra, no vídeo que acompanha esta matéria.